Inquérito é suspenso por se basear em quebra de sigilo pela Receita Federal

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região suspendeu liminarmente inquérito policial instaurado para apuração de suposto delito de sonegação fiscal. A suspensão se deveu ao fato de que, na esfera cível (3ª Turma do TRF), foi julgado parcialmente procedente recurso de apelação em Mandado de Segurança impetrado para proibir a Receita Federal de utilizar dados bancários obtidos sem autorização judicial.
Segundo consta nos autos do habeas corpus, os pacientes alegavam sofrer constrangimento ilegal no inquérito policial devido ao uso indiscriminado de prova ilícita obtida irregularmente pela Receita Federal. Segundo relatado pela defesa, a Receita Federal teria obtido os dados sobre as movimentações bancárias em questão sem prévia autorização judicial, procedimento este ilícito por violar diretamente ditames da Constituição Federal por implicar acesso não autorizado a informações privilegiadas.
Ocorre, porém, que a empresa que vinha sendo investigada já havia impetrado Mandado de Segurança requerendo que a autoridade fiscal se abstivesse de utilizar os dados e movimentações bancários obtidos sem autorização judicial.
Embora existam normas legais liberando ao Fisco acesso aos dados bancários do contribuinte, a 3ª Turma do TRF entendeu que a prática viola o direito à intimidade e à vida privada, garantidos pela Constituição Federal (art. 5º, incisos X e XII da CF). Os magistrados esclareceram que não é vedada à Administração Pública a investigação e apuração de eventuais ilícitos cometidos, desde que sob o crivo do Poder Judiciário ao qual cabe avaliar a necessidade da medida de eventual quebra de sigilo.
Assim, segundo o desembargador Paulo Fontes, relator do Habeas Corpus, a decisão da 3ª Turma do TRF, ainda passível de recurso, suspendeu a constituição definitiva do crédito tributário e, de acordo com a Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal Federal, “não se tipifica crime material contra a ordem tributária (…) antes do lançamento definitivo do tributo”. E, segundo o art. 93 do Código de Processo Penal, se o reconhecimento da existência da infração penal depender de decisão sobre questão de competência do juízo cível, o juiz criminal poderá, desde que essa questão seja de difícil solução e não verse sobre direito cuja prova a lei civil limite, suspender a ação penal.
Trata-se de uma decisão importante por fortalecer a tese da máxima “é inconstitucional normal legal que conflite com preceitos da Constituição da República, independente da matéria”.
O art. 6º da Lei Complementar nº 105/2001 autoriza a Receita Federal a solicitar às instituições financeiras documentos referentes à movimentação financeira da empresa fiscalizada, que teriam servido de suporte aos lançamentos da contabilidade, caso esta se negue, injustificadamente, a apresentá-los ao auditor quando da fiscalização.
Felizmente, alguns Tribunais Superiores vêm proferindo decisões reconhecendo que a quebra do sigilo bancário somente é possível com autorização judicial, por direitos garantidos constitucionalmente por meio de cláusulas pétreas.
Ademais, o Pleno do STF, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 389808/PR, entendeu ser conflitante com a Constituição norma legal atribuindo à Receita a possibilidade de afastar o sigilo de dados relativos ao contribuinte. Essa decisão, entretanto, ainda se restringe ao caso em concreto, já que a matéria ainda está por ser decidida, pelo Plenário, em sede de repercussão geral, no RE 601314, pendente de julgamento pelo Supremo.
Leia aqui íntegra do acórdão do Habeas Corpus e aqui a íntegra do Recurso de Apelação em Mandado de Segurança.